Em Junho, uma exposição vai mostrar o trabalho de 70 arquitectos, designers e artistas que olharam para a pedra portuguesa. E uma conferência vai pô-los a discutir os seus processos criativos com este material.
Álvaro Siza escolheu o mármore branco vigária, Eduardo Souto de Moura o mármore ruivina escuro, Amanda Levete o mármore pele de tigre e os irmãos Bouroullec o mármore verde de Serpa. Marina Abramovic preferiu o granito gabro de Odivelas, enquanto Julião Sarmento usou o calcário azul cadoiço e Jasper Morrison o calcário alpinina.
Os nomes poéticos das pedras portuguesas incluídas no programa de internacionalização desta matéria-prima são com certeza uma mais-valia para os arquitectos, designers ou artistas que com elas escolhem trabalhar – os exemplos algo exóticos abundam, entre os mais de 70 tipos de pedras listados no site da iniciativa Primeira Pedra. O programa começou há quatro anos, quando a ExperimentaDesign, a fechar um ciclo de 18 anos dedicado à organização da bienal com o mesmo nome, foi contactada pela Assimagra, a associação dos recursos minerais portugueses, com o objectivo de relançar o sector.
Com financiamento europeu, fizeram-se bancos, cadeiras, fontes, anéis, taças, escorregas, paredes, esculturas, instalações e até se pavimentou uma rua em Londres, ao abrigo deste programa que agora conclui as suas duas primeiras etapas. Contabilizam-se 70 obras de 35 criadores que serão mostradas numa exposição retrospectiva no Museu Nacional dos Coches, em Lisboa, e discutidas numa conferência internacional, ambas marcadas para 26 de Junho. “Não é o fim do programa porque ele só terminará em Paris no final de Setembro, com a última exposição fora de Portugal, mas é a primeira e a última grande exposição onde já teremos todos os projectos”, explica ao PÚBLICO Guta Moura Guedes, directora artística do Primeira Pedra.
Em Lisboa, no interior e no exterior do museu, num contraste entre a essencialidade da pedra e a madeira dourada barroca dos coches, vai ser assim possível ver os sete últimos trabalhos da Primeira Pedra, sobre o tema da sustentabilidade, que são assinados por nomes como Phillipe Starck (designer), Carla Juaçaba (arquitecta), Jonathan Olivares (designer), Manuel Aires Mateus (arquitecto) e o atelier R2 Design, mas também obras que já foram exibidas em Veneza, Nova Iorque, Londres, Milão, São Paulo ou Weil am Rhein, de Carsten Holler, Bijoy Jain, Alejandro Aravena, Stefan Sagmeister ou dos irmãos Campana, entre muitos outros criadores.
“Estou siderada com a pedra portuguesa, porque o nosso país é muito diverso. As erupções de pedra são muito distintas, mesmo que estejam próximas: um mármore verde Viana pode variar muito os seus dourados e castanhos; o granito garbo de Odivelas, quase negro, parece um mármore quando é polido”, continua Guta Moura Guedes. “Cada uma das pedras é única, como nós. Temos insistido muito com os criadores para irem às pedreiras.”
Às vezes, é necessário abri-las, cortá-las, porque nem sempre é possível antever como são por dentro. “O Siza e o Souto de Moura, que têm anos de experiência com a pedra portuguesa, sabem vê-las de fora. Mas nós só percebemos quão uniforme era o monólito em mármore de ruivina usado pelo atelier de Alejandro Aravena para fazer um escorrega para crianças quando começámos a escavar a pedra. Já a ruivina do Sagmeister é menos uniforme, menos raiada de branco, mas também é mais preta. Tem sido uma surpresa muito grande para todos.”
O universo das pedras do programa divide-se entre os xistos, os calcários, os granitos e os mármores. Os granitos têm sido menos solicitados, os xistos só vão surgir agora no projecto parisiense. “Os arquitectos e os designers têm uma grande atracção pelo mármore, que é difícil de contornar. Tem uma beleza muito própria e um carácter histórico. Em Portugal, o anticlinal de Estremoz mostra uma erupção muito particular, com variações cromáticas muito interessantes, brancos tão puros como o mármore de Carrara.”
Mas nem mesmo os mármores estão todos explorados, acrescenta Guta Moura Guedes, sendo que algumas pedreiras foram desactivadas nos últimos tempos. O Primeira Pedra quer, por isso, reposicionar a indústria transformadora. “A nossa pedra vale tanto como a italiana do ponto de vista da qualidade, mas não consegue chegar ao mesmo valor de mercado, porque não tem a mesma imagem.”
A conferência internacional, que terá lugar no Teatro Tivoli, pretende pôr o máximo possível de autores a falar do seu processo criativo quando abordam a pedra, com moderadores como Joseph Grima (arquitecto e crítico), Justin McGuirk (Design Museum), Hans-Ulrich Obrist (Serpentine Galleries) ou Zoe Ryan (Art Institute of Chicago). Das 73 amostras de pedra portuguesa recolhidas no site, já foram usadas 26: o Museu dos Coches vai ver a estreia do xisto negro de Foz Côa.
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In: Público