A Noruega sabe que o seu futuro continua a depender dos combustíveis fósseis, agora cada vez mais, dada a escassez de energia na Europa, agravada por causa da guerra militar da Rússia contra a Ucrânia e da guerra económica entre a Europa e a Rússia.
De regresso da Noruega, ainda no avião, escrevo esta crónica a pensar nalgumas semelhanças e sobretudo nos contrastes entre os dois países.
Na segunda maior cidade da Noruega, Bergen, vi muita gente vestida com roupas simples e calçado confortável, sem marcas de luxo, sem ostentação, sem pretensiosismos. Na verdade, numa região em que chove quase todos os dias no verão, o que mais se vê é roupas impermeáveis de marcas indistintas.
Em Bergen, vi alguns sem abrigo e até, pasme-se, um a pessoa que vasculhou os caixotes do lixo de uma rua inteira enquanto a percorria.
Vi alguns edifícios degradados, grafitados e abandonados no centro da cidade…
Lembrei-me do célebre indicador do segundo maior PIB Per Capita do mundo, a seguir ao Luxemburgo, mas pensei para comigo: sim, é uma média estatística, a do PIB total da Noruega dividido pelo número total de cidadãos que nele vivem. Alguns ganham muito dinheiro, muitos ganham bem para os padrões mundiais e até europeus, mas ainda há outros que ganham modestamente para um país onde é tudo muito caro a começar pela alimentação.
Quanto a cidadãos sem teto nem meios de subsistência, existem em qualquer cidade portuguesa e em número inaceitável para o país que poderíamos ser.
Vi também, a poucos quilómetros a norte da cidade de Bergen, já na zona de paisagem protegida dos fiordes, uma enorme refinaria, uma das maiores da Europa.
E vi também, tanto durante a aproximação do avião à cidade, como depois, desde os miradouros de Floyen e Ulrikken, duas enormes plataformas de extração de petróleo junto às ilhas, a poucos quilómetros a noroeste de Bergen.
Um país que é uma referência na preservação do meio ambiente, basta ver o cuidado que exigem, e bem, aos visitantes dos fiordes, das florestas e dos glaciares, continua a contribuir para o aquecimento global, porquê?
A resposta é simples:
A Noruega não tem agricultura extensiva e de escala suficiente, dado o relevo acidentado do terreno e o rigor do clima; Não é um colosso industrial, apesar de ter algumas excelentes indústrias exportadoras; Não é um destino massivo de turismo, desde logo porque tem um nível de vida muito caro.
A Noruega sabe que o seu futuro continua a depender dos combustíveis fósseis, agora cada vez mais, dada a escassez de energia na Europa, agravada por causa da guerra militar da Rússia contra a Ucrânia e da guerra económica entre a Europa e a Rússia.
Em Portugal, há comprovadamente jazidas de petróleo ao largo do Algarve e provavelmente também ao largo do Alentejo; há provavelmente gás natural no Oeste, em terra e ao largo; Há seguramente muitas jazidas de lítio.
Ao mesmo tempo, os mesmos governos fracos perante os lobbies dos negócios da energia e do imobiliário, a começar pelo atual, cedem aos seus interesses como as ervas se dobram ao vento.
O petróleo não é explorado, o gás nem pensar, o lítio a ver vamos.
No local da refinaria da GALP em Matosinhos, que fechou contra o interesse económico do país, foi oficialmente anunciado um gigantesco projeto imobiliário com disfarce de uma parte destinada a um campus de investigação universitária.
Em Sines e no Pego foram fechadas as duas centrais a carvão, que produziam a eletricidade mais barata do país antes de o atual governo ter aplicado taxas de carbono brutais.
Agora nem estas taxas o Estado recebe nem eletricidade suficiente o país fabrica; no primeiro semestre importámos mil milhões de euros de eletricidade de Espanha, grande parte produzida a carvão no país vizinho pela própria EDP.
O secretário de estado do Ambiente, João Galamba, continua a jurar que o regresso ao carvão em Portugal, nem pensar! Bem pode limpar as mãos da sua incompetência. Os resultados estão à vista e as manchas não vão sair por muito que esfregue.
Os dois me alvejaram com direitos de resposta quando denunciei as suas verdadeiras intenções. Podem enviar mais, com a tendenciosa ERC do seu lado, a nossa emissão é garantida.
Duarte Cordeiro ainda nem aqueceu o lugar, mas a cassete que debita é igual à do seu antecessor e à do mesmo secretário de Estado, que dura, e dura, e dura, muito mais que uma bateria de lítio, (importada, porque por este andar, Portugal não as fabrica nem nunca fabricará).
Sobre todos estes iluminados das novas energias alternativas, pontifica o primeiro-ministro, o mesmo que sabe que a produção de eletricidade fotovoltaica em Portugal já não pode ser aumentada no regime de “feed in tariff”, ou de subsídios indiretos, porque esta forma de energia já entope o sistema nas horas de sol (e falha redondamente quando este não brilha).
Mas como os lobbies da eletricidade fotovoltaica não querem mais concursos a preços de mercado porque estes são muito baixos, pediram ao governo que lhes arranjasse um novo regime de preços subsidiados com garantia de Estado: o regime que vai servir a eletrólise da água para produzir o chamado hidrogénio verde.
Uma forma de produção que vai gastar 1,6 unidades de energia para produzir uma única nova unidade de hidrogénio equivalente: a maior estupidez económica em que Portugal se vai meter, com o apadrinhamento da Comissão Europeia, que gosta de fazer Portugal de cobaia.
Para quem julga que isto é ficção, vejam bem o quadro da distribuição das maiores fatias de verbas do PRR…
Na Noruega, como na generalidade dos países nórdicos que não gostam do crony capitalism, o capitalismo de favores, os projetos de hidrogénio verde são experimentais, de reduzida dimensão, e de caráter científico, não de aventuras industriais gigantescas como a que em Portugal o governo lançou imprudentemente.
Na Noruega, o petróleo, esse diabolizado petróleo, continua a ser produzido e exportado e assim continuará a ser por muitas décadas.
E a enorme refinaria a poucos quilómetros a norte de Bergen, lá continuará por muitas décadas, ao contrário da Petrogal em Matosinhos.
Deve ser porque são pobres, estes irresponsáveis noruegueses. Bem vistas as coisas, Portugal é um país rico.
Um farol da Europa e do mundo nas novas energias alternativas. Permite-se fechar refinarias, centrais a carvão, e impedir a exploração de recursos naturais.
Um país brutalmente endividado, mas orgulhosamente na vanguarda das energias verdes, com um primeiro-ministro que dá ralhetes em público aos parceiros europeus, acusando-os de se estarem a atrasar na transição energética!
Pobre país rico…
In: SIC Noticias