Traz mais burocracia, tem um carácter “punitivo” e vai ter impactos “muito significativos” no sector. Associações e empresários contestam proposta de nova lei das pedreiras
O projecto de Decreto-Lei para regulamentar o sector das pedreiras “apresenta um elevadíssimo grau de burocratização, que irá culminar num desenfreado sentido de punição, não contemplando os direitos adquiridos das pedreiras existentes e devidamente licenciadas, designadamente no que concerne às zonas de defesa”. É esta a posição da Associação dos Recursos Minerais de Portugal (Assimagra) sobre a proposta para a nova lei das pedreiras, que esteve em consulta pública até final de Agosto. A avançar como está, a legislação “terá impactos muito significativos”.
Ao JORNAL DE LEIRIA, Célia Marques, vice-presidente executiva da associação, lembra que “qualquer legislação com impacto negativo num sector afectará, sempre, a sua capacidade de criar emprego, de manter as taxas de crescimento das suas exportações a dois dígitos, como era o caso, e afectará, seguramente, de igual forma, o seu o volume de negócios”. O “aumento generalizado das zonas de defesa” contemplado na nova legislação “irá inviabilizar um número significativo de explorações”, entende a Assimagra.
“O aumento destas distâncias deverá ser considerado para as situações que se comprove ser necessário e para as quais não estejam asseguradas as condições de segurança de pessoas e bens e, nesse caso, o próprio projecto de Decreto-Lei já permite a alteração dos limites das zonas de defesa, pelo que não existe justificação técnica para um aumento generalizado de 10 metros nas distâncias mínimas de protecção”, argumenta.
Também Samuel Delgado, administrador da Solancis, de Alcobaça, considera que o alargamento das zonas de defesa “será um problema. O empresário entende ainda que os prazos definidos para vários procedimentos são “irreais” e que os serviços da Administração Pública não conseguirão responder em tempo útil. O facto de algumas decisões transitarem para os municípios também é visto com apreensão por este gestor.
Com forte expressão no concelho de Porto de Mós, por exemplo, as explorações de pedra de calçada poderão estar em risco, aponta a Assimagra. “Outro exemplo que irá gerar impactos muito significativos na subsistência de pequenas explorações é a supressão da actual classe de pedreiras de calçada e de laje, que passarão a estar incluídas numa classe com excessivas exigências administrativas e técnicas”.
Para a Assimagra, “é importante reconhecer as especificidades” do sector da exploração de pedra, “para que se possa reflectir sobre as suas necessidades, culminando numa alteração legislativa passível de ser efectivamente aplicável no terreno, que regule a actividade extractiva, sem colocar no mesmo prato da balança as empresas com antecedentes e as empresas que concluíram, ou se encontram em vias de concluir, os seus processos de adaptação e regularização e que têm cumprido com todos os requisitos das suas licenças, assim como com os encargos associados”.
Célia Marques afirma ainda que “esta alteração legislativa deveria, antes de mais, ser pensada para colmatar os erros de aplicação dos anteriores diplomas que a antecederam”. “Legislar de uma forma tão profunda em cima de uma pandemia não é de todo razoável, quando a instabilidade e imprevisibilidade que advém desta pandemia já é tão considerável”, frisa. Está-se “a colocar nesta altura mais incertezas neste sector de actividade, já muito penalizado, quando o mesmo necessita de estabilidade legislativa para a possibilidade de uma retoma económica mais forte e sustentável”. A responsável adianta ainda que “em termos gerais, é fundamental adequar as normas à realidade do sector, através de um necessário equilíbrio entre os interesses públicos do desenvolvimento económico e a protecção do ambiente”.
A Assimagra entende, por isso, que “a entrega do poder de decisão sobre o parecer prévio de localização aos municípios é um dos maiores retrocessos desta proposta de Decreto-Lei”. “Como os recursos minerais muitas vezes não estão contemplados nos PDM, permanece sempre a dúvida quanto à respetiva compatibilidade”. “A proposta de Decreto-Lei com vista à regulamentação da actividade extractiva parece promover uma visão, talvez, demasiado restritiva desta actividade”, entende Regina Vitório. A administradora da LSI, de Porto de Mós, lembra que “a competividade da indústria transformadora de pedra natural em Portugal, que tanto tem evoluído na capacidade de agregar valor, assenta em grande parte na disponibilidade de uma matéria prima de grande qualidade estética e técnica”.
“Acreditamos ser possível conciliar a actividade extractiva e a sustentabilidade que obviamente se pretende na utilização de uma matéria prima que é absolutamente natural e, por isso, as unidades extractivas de rocha ornamental são de menor dimensão e promovem a sua actividade de uma forma programada e diria até lenta, o que deverá ser associado a princípios de sustentabilidade ambiental e social”. A empresária de Porto de Mós lembra ainda que “o sector extractivo terá necessariamente de manter a evolução que o tem caracterizado, terá de ser capaz de fazer melhor e de fazer mais para que essa imagem seja clara e perceptível, no entanto o acesso ao recurso é um elemento essencial na competitividade das empresas, que dele dependem, assim como dezenas de milhares de postos de trabalho directos e indirectos, para a sua actividade”.
Também a Associação Nacional das Indústrias Extractivas e Transformadoras (ANIET) entende que a nova legislação terá impactos negativos no sector. Em comunicado, citado pela Lusa, frisa a complexidade da lei e o seu “carácter punitivo”. “Esta proposta de lei apresenta 144 páginas, ainda que posteriormente possa ser condensada para outro formato, mas a actual lei de pedreiras (DL 340/200), por exemplo, tem 38 páginas. Onde está o Simplex contemplado no PEES [Programa de Estabilização Económica e Social]?”, criticou Francelina Pinto, directora-geral da associação. A ANIET entende ainda que “além da complexidade”, a nova regulamentação “reveste-se de um carácter punitivo, como justificação para a necessidade de um novo enquadramento legal, conforme se pode constatar pelas 88 vezes que as palavras ‘encerramento’ ou ‘encerrar’ ocorrem no texto”.
“O aumento das zonas de defesa das pedreiras irá criar sérios e graves casos de atrito entre a Administração e as empresas, sendo certo que as zonas de defesa que estão regulamentadas na actual lei de pedreiras, conjugadas com legislação complementar, desde que sejam cumpridas, na esmagadora maioria dos casos, se não na sua totalidade, são suficientes para que existam objectivamente condições de segurança”, defende a ANIET. “Tememos uma grave crise, e com esta lei Portugal poderá assistir de forma abrupta à falta de abastecimento de matéria-prima e a uma grave queda nas exportações, com os correspondentes efeitos a fazerem-se sentir na balança comercial. Não duvidamos ainda que provocará o encerramento de várias unidades extractivas”, aponta Francelina Pinto, citada pela Lusa.
In: Jornal de Leiria